quarta-feira, janeiro 10, 2007

(o corpo cai. há quanto tempo? não sabes, sabes que talvez estejas em queda livre há demasiado tempo. acordaste agora, sabes que cais desde que adormeceste, e desde que acordaste antes disso. talvez seja por isso que tudo o que se passou pareça um sonho. agora abres os olhos. e habituas-te.)

E ergues-te. Ergues-te mesmo se o teu corpo ainda cai no meio de uma escuridão inominável. Por ti, a espaços, passam fragmentos soltos, a espaços passam fantasmas. Os do costume. Tens os olhos fechados, mesmo que os escancares, porque à tua volta só vês o escuro, e permites apenas aquilo que o breu te proporciona. E isso é tudo aquilo que temes e abominas. Há quanto tempo esperas o fim? Há quanto tempo o anuncias? Há quanto tempo os teus gestos repetem o sistema que nunca será o teu? Há quanto tempo que a mudez, como uma mancha, invadiu até os redutos que julgavas invioláveis, a magia que julgavas ser real, o sorriso que te dava as cores do mundo, e transformou o teu quotidiano num poema sarcástico em que máscaras de comédia se transformaram em pontos de interrogação intermináveis? Cais, sem fim, não há fundo neste lugar. Por isso estendes um braço, rasgas as paredes e descobres o que há por trás do pano frágil feito do mesmo material daquele olhar que te tirava a respiração. E então percebes que tudo esteve sempre lá, e está ainda ao teu alcance. Mas primeiro, tens de deixar tudo o resto para trás. Por mais que digas a ti próprio que ainda vale a pena. Por mais que o teu coração grite e te agarre ao passado que afinal, como tudo o que te liga a ele, se desfez em cinzas.


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