Dentro do corpo que lateja no escuro,
Dentro da mente que preferia adormecer-se,
Dentro do coração ferido, cicatrizado, mortiço, mas vivo,
Dentro dos olhos, semicerrados como ostras inconformadas,
Dentro do mudo e frio cubículo feito em casa,
Dentro da isolada cama, isolada como uma ilha,
Dentro da memória que repete, como num bar decrépito, os mesmos velhos e usados discos,
Dentro dos pensamentos que se sucedem como uma torrente de pesadas figuras geométricas,
Dentro das palavras que se atropelam em pânico em direcção à sua saída,
Dentro do nú palpitar da noite, e da sua viciosa e cruel canção de insónia,
Dentro do debitar torturante de dúvidas espalhadas pelo leito,
Há espaço até para o que julgava nunca poder voltar a ter espaço.